Falso deus

gislenebosnichpor Gislene Bosnich*

Quando algo começa a mostrar-se necessário e valioso os homens logo deixam de enxergar o necessário como realização de sua capacidade e emancipam o objeto que criaram dando-lhe vida própria. Este é o novo caso de estranhamento que vem ocorrendo com a internet.

A internet não é um ente mirabolante que nos faz o favor de apresentar uma série de dados ou de realizar pesquisas sobre assuntos pitorescos. A internet é produto de homens, de pessoas de carne e osso que colocam o produto de seu trabalho a disposição de outros homens. A internet é um instrumento também produto do trabalho de outros, mas não é por si só uma maravilha superior ao criador. A internet é o acesso, mas não é nada sem a atualização da produção humana.

Isto precisa ser compreendido e é bom lembrar que recente pesquisa apurou que a maior parte dos sites brasileiros não dispõe de atualização. E sem atualização – feita por gente de verdade – e não por nenhum programa autônomo, não há informação e sem informação a internet é como uma notícia perdida, descartável, preste a tornar-se pronta para o embrulho. Quero dizer que internet é trabalho humano e não um amontoado de programas mirabolantes que nada dizem e que, em princípio, podem até encantar, mas morrem nas areias das praias daqueles sem intenção, manipulados sempre por quem sabe plantar uma aparente verdade que encobre interesses particularistas.

Inovações de propósitos

Também não é verdade que a Internet substitua uma pesquisa verdadeira ou a ida a um Museu em qualquer parte do mundo como o governo, com suas campanhas televisivas, quer nos fazer acreditar. O mundo virtual não substitui o real. A internet é uma ferramenta para quem trabalha contra o tempo, pois, quem trabalha a seu favor e dispõe de dinheiro para suas empreitadas apenas a utilizará como um guia e nisto de fato reside seu valor, pois, não é verdade que encontramos tudo que desejamos na internet.

Um livro raríssimo continua tendo de ser comprado e sequer pode ser ‘baixado’, através de algum programa. Portanto, a internet não é uma grande biblioteca. É um grande roteiro de evidências para se descobrir um livro numa biblioteca real ou então encomendá-lo virtualmente. Uma grande fonte de dados, mas não necessariamente o acesso completo a eles. Sem contar as home pages que cobram pelo acesso. Aliás, sem contar que temos de pagar pelo provedor, porque afinal de contas não demorou muito para suspenderem os provedores gratuitos ou estes provaram-se praticamente inviáveis, empelindo-nos ao provedor pago. Imagine se tivéssemos de pagar, além da energia (quando há), uma taxa extra para assistirmos aos programas televisivos. Sem contar também os cartéis que envolvem as conexões rápidas que não necessitam da discagem telefônica. Há muitos percalços para que a internet fique mais semelhante ao que se imagina que ela seja.

E a internet tem muitos empecilhos que precisam ser eliminados por nós para que o veículo preste-se mais àquilo que motivou seu nascimento. Talvez a rede de fato não seja a mina de ouro do capitalismo. Os investimentos têm sido tão altos quanto às falências em brevíssimo tempo. É preciso inovar o propósito, pois, caso contrário, o aparente emissário da pós-modernidade irá cair na pasmaceira oficial de outros mecanismos de informação.

Utiliza-se a internet para atingir a pessoas reais em suas atividades reais de transformação do mundo. Ainda atingimos poucos, pois, num país de analfabetos a internet é jóia rara, como uma ‘pepita’ em Serra Pelada.

Sem endeusamento

Parece contraditória fazer esta crítica à internet quando me utilizo dela para transmitir a mesma crítica, mas isto é apenas aparência, já que na maior parte do tempo temos de lutar no interior do campo inimigo e transformá-lo, deixando de reproduzir sua lógica; alterando sua gênese; este movimento que pretende imprimir à virtualidade poder supremo sobre a realidade.

Um mundo mais rápido, à la just in time, tem lá suas exigências de veículos mais rápidos, mas parece que nenhum tornou-se erroneamente tão independente da atividade humana quanto a grande teia. Precisamos utilizar seus fios e não nos emaranharmos nele. Assim como outro veículo, se mal utilizada só traz a manipulação. Vejamos o que acontece com a grande mídia. Um retalho mal costurado da oficiliadade, na maior parte dos dias.

Penso que este seja um dos erros dos sites noticiosos e da maior parte dos blogs; ausentarem-se da realidade do mundo e tornar mundial sua realidade umbilical que, raras vezes, escapa da mediocridade de uma vida afirmativa, despolitizada ou da oficialidade do “anunciante”, muitas vezes a própria grande mídia que encontra megafone para repercutir sua manipulação. O fato é que deve existir uma intenção na comunicação, qualquer que seja e para o que seja. E há poucos umbigos interessantes para virarem notícia. E estamos fartos de “reality shows”, com seus objetivos rasteiros na busca do “sucesso”. É certo que a impotência produzida por anos de repressão faz com que no momento em que a liberdade de expressão pareça facilitada haja uma explosão de comunicações que nada dizem.

Justiça seja feita. Há blogs que parecem pichações e outros que se assemelham a grafites, ou seja, que transmitem algo, que de fato pretendem ser veículos de comunicação. Mas escrever não tem sentido se for uma atividade de ermitão. Ninguém escreve para si mesmo. (A não ser em momentos muito especiais). Escreve para atingir o outro. Para despertar no outro alguma atitude, ainda que num primeiro momento seja reflexiva. Cabem as perguntas: se os milhares de blogs levam ao “limite” o ato de se “linkar” mutuamente, porque não aprimorar essas mensagens para algo que realmente seja transformador em nosso cotidiano real? Será que a abundância não disfarça métodos semelhantes aos utilizados pela mídia de massa, que repetem conceitos e interesses à exaustão, deslocados da nossa realidade?

A internet pode ser reivindicada, mas não endeusada e muito menos “seqüestrada” da atividade humana e do momento histórico em que ela nasceu. Se a necessidade de imprimir velocidade a todas as relações de produção do capitalismo criou a grande rede podemos transformá-la para destruir formas que nos oprimem e não para que ela seja o espírito do grande irmão, ou “Big Blogger”, se preferirem. Além disso, não me agrada saber que os e-mail’s podem ser vasculhados e meus arquivos bisbilhotados por uma dita inteligência governamental – brasileira ou não.

Engajamento e projetos amplos

Se houver uma conspiração contra o poder mundial ela não será pela internet. Pelo menos não por esta internet que conhecemos hoje, onde o principal propulsor é tornar os fortes ainda mais fortes e os fracos ainda mais alijados de qualquer “revolução”. Será que é possível humanizar aquilo que é fruto do capitalismo, principalmente, de sua fase absolutamente desumanizadora?

Não temos conseguido isto com as demais mídias. E se lá não podemos adentrar porque não detemos os meios de produção, aqui na Web há uma certa facilidade sob este prisma. Mas não podemos agir individualmente, como se houvesse uma segunda Torre de Babel (já nos basta a mitologia católica que criou a primeira). Devemos nos engajar em projetos mais amplos que, no mínimo, pretendam democratizar e garimpar novos colaboradores militantes em causas realmente valiosas.

Talvez esteja aí o grande dilema da internet: quais são as causas que podemos compartilhar? Muitos interesses dispersos e muitos mais distintos. É preciso compartilhar mais do acordo e do desacordo. É necessário outra pauta, outros “posts” que possam enaltecer atividades dignas e não só a miséria produzida. É preciso parar de apenas enviar o artigo por e-mail aos amigos. Temos de abraçar os amigos! É preciso criar o tempo que nos tiraram numa pressa que não poderia existir mais. (Pois, então, para que servem as máquinas que criamos?) É preciso participar, criticar e escrever mais sobre um dilema bem mais amplo: o mundo que desejamos construir e que tentamos fazê-lo num cotidiano mais severo e possibilitador que há para além de monitores e teclados.


* Jornalista independente e socióloga. Publicado na REA, nº 10, março de 2002, disponível em http://www.espacoacademico.com.br/010/10gislene.htm

20 comentários sobre “Falso deus

  1. Nota de esclarecimento: amigos e amigas, com os quais tenho a honra de conviver e muito aprender, apontaram as incorreções (não de idéias) cometidas por mim no corpo dos textos produzidos em resposta às fiórdicas divagações anti-internéticas. A crítica abalizada procede. Mas o caso é que fiquei tonto, acometeu-me algo como uma labirintite lexical ante tal profusão argumentativa. Prometo mais atenção.

    Grato

  2. Propõe-se então o fim da internet, o fim do capitalismo e o fim da democracia nos moldes atuais?
    Ou seria somente uma proposta de remodelagem de tudo isso só para reconfigurar a atualidade?

    Poxa… cada vez que me deparo com críticas dessa natureza, já imagino os idos de décadas recentemente passadas: jovens com um tal livrinho vermelho sob a axila, circulando pelas universidades (ostentando-o, claro), sendo subversivos como a própria idade exige, cabelos compridos, barbas compridas, enfim…

    Talvez a exigência mais cruel para esses jovens seja uma só: se localizarem no espaço e no tempo HOJE. Eis o ato (ou atitude) sofrível para alguns que, outrora, imaginaram um mundo diferente, que se adaptasse às suas vontades (e não o contrário).

    Porém, isso não aconteceu (óbvio), e por essa razão, vivem chorumingando via “textos científicos” sobre aquilo que era para ter sido mas nunca foi. A história construiu-se por si, sem o atendimento às vontades dos que queriam algo que ela (a história) não lhes permitiu (óbvio).

    O discurso é conhecido e repisado: a prática, em forma de realidade, é ignorada. Isso também ficou óbvio no texto.

  3. Continuando:

    Nenhuma crítica realmente, nos parâmetros acadêmidos (recordando: o meio é Revista Espaço Acadêmico) foi feita ao capitalismo. Como disse, suspeito que o capitalismo não tenha se apercebido desta “crítica” em especial. Crítica, cara senhora, implica 9anote – pode ser útil num futuro próximo) em acurado exame de um sistema, de uma idéia, de um fato com o intuito de se produzir uma apreciação lógica, epistemológica, estética ou moral sobre o objeto da investigação. Não percebi nehuma dessas possibilidade no seu “arrazoado”. Quanto a “farsa da construção de uma pseudo democracia via internet”, devo reconhecer que ultrapassa em muito minha capacidade de compreensão dos termos e conceitos. Farsa? Onde? Sem dúvida uma democracia foi “construída” mediante a internet. O que se pode ter acesso via rede, hoje, era impensável vinte anos atrás. Se existem os que ainda não possuem computadores e acesso a net, há, outrossim, milhares que dela fazem uso funcional, ou seja, com fins imediatos e utilitários (precisa dizer quais?). “pseudo-democracia”, então, é expressão de efeito, meramnete isso, e não se sustenta historicamente. Quanto ao domínio da lingua portuguesa: concordo plenamente com a “interlocutora”. Não temos mesmo (inclu-me sem pejo). Já o dito: “Não é o caso de descer das nuvens, mas de não ficar pousada, ou aterrisada, sobre elas”. Rogo por esclarecimentos do que vem a ser isso. Na sequência: se os títulos não conferem, seria recomendável correções e identificações verídicas. Por exemplo: Léo A. Mittaraquis, professor de filosofia UFS (CODAP/UFS), mestrando concludente (História da Educação). Cf. Plataforma Lattes. Como a palavra comentário foi grafada no plural, não ficou claro se meu comentário se inclui na classificação “sem propósito”. O vocàbulo “propósito” entre outras significações pode ser assim compreendido: aquilo a que alguém se propôs ou por que se decidiu. Meu (ou meus) comentário(os) é repleto de propósito, sendo dois os principais: estabelecer discussões, questionar afirmações. Produzir um texto na tela do computador, valendo-se do teclado ou qualquer outro periférico que torne isso possível, não é trabalho menos humano do que o produzido mediante o escrever com lapís.O que vem a ser transformações subjetivas e objetivas, mesmo? E quanto a opinião humana expressada em sua real complexidade, fico a refletir quando é que se dá a opinião humana numa falsa (ou irreal) complexidade. Mas, não restam dúvidas que o texto evoluiu. A conclusão deste último ao qual respondo é muito pior do que o anterior.

    Nestes termos,

    Léo A. Mittaraquis

  4. Crítica, pelo menos no campo científico (creio que este o é), exige muito mais que a pura doxa, exige a epistumeme. Só assim será uma crítica: esta compreendida (anote) como um exame de um princípio ou idéia, fato ou percepção, com a finalidade de produzir uma apreciação lógica, epistemológica, estética ou moral sobre o objeto da investigação. A propósito, esta definição se encontra, creio, até nos melhores dicionários. A pretensa crítica ao capitalismo não se deu nem no nível mais elementar. Senão vejamos: por capitaismo compreende-se um sistema de operação de uma economia que se caracteriza pela convivência entre a liberdade de iniciativa pessoal e a livre concorrência entre empresas, com pouca intervenção do Estado. Assim sendo, para que realmente se produza uma crítica ao capitalismo, faz-se necessário analisar e valorar, em contraposição a um sistema não capitalista, ou a uma outra “forma de capitalismo” (um tanto mais complexo), cada aspecto constituinte da “natureza geral do sistema”. Isso pelo menos. E a expressão “natureza geral “em é a mais adequada aqui.
    Quanto “a farsa da construção de uma pseudo democracia via internet”, não percebi (certamente por causa da minha ignorância) algo assim. A internet é verdadeiramente democrática. o “pseudo” não cabe. (to be continued)

  5. Hummmmm!

    Ao que parece, cabe-me a missão de responder à resposta da “jornalista independente” (continuo sem saber o que vem a ser isso. Tanto mais por, se levarmos em conta o título da revista Revista Espaço Acadêmico, pois, num espaço acadêmico a explicitação de conceitos e títulos é fundamental),socióloga (graduada e pós-graduada onde?) e professora (qual disciplina? Nível fundamental, médio ou terceiro grau?).
    Bem… Vamos lá: 1) o que foi criticado por mim e não foi expresso pela eruditíssima ensaísta? 2) Qual a prova documental e estatística detida pela iluminada intelectual que comprova a sua afirmação de que em 2002 a internet não se encontrava tão disseminada como hoje? Obs: certamente, em 2002 a rede estava mais “disseminada” do que em 1999, 2000 e, suspeito, 2001 (ma sposso estar enganado); 3) Talvez a sapiente interlocutora possa explicar o que entende por “categoria” e por “ferramenta”. Sua última resposta (?) fugiu ao debate neste aspecto (o que é?); 4) A senhora não criticou o capitalismo (suspeito que o próprio nem se deu conta disso). (To be continued)

  6. Caríssimoscomentaristas,

    O que será que alguns leitores têm que não compreendem um texto e o criticam naquilo que ele não expressa.
    A ignorância na interpretação de algumas pessoas com seus comentários descabidos é escandalosa. Por se jornalista e professora não seria burra de não perceber a importância desta ferramenta (que em 2002, quando escrevi o artigo não estava tão disseminada; fato que alguns desconhecem). Porém, a encerro na categoria de ferramenta, apenas. Se não se sabe usá-la pode não valer nada mesmo. No entanto, o fetiche faz com que a ferramenta passe a ser superestimada em relação ao que foi produzido. É a produção humana que deve ser destacada e não a ferramenta pela qual ela é disponiblizada. As bibliotecas virtuais são ótimas mesmos, mas o que questiono é que todos deveríamos poder frequentá-las onde quer que fossem, as visitas poderiam ser físicas. Isso, poucos parecem ter compreendido. Chamo aqui a atenção para o que parece óbvio, mas não o foi para alguns leitores desatentos: estou criticando o capitalismo e a farsa da construção de uma pseudo democracia via internet. Por favor, se isto não foi compreendido… é lastimável.
    O que percebo é que a riqueza da ferramenta melhora a partir do conhecimento humano compartilhado, refletido também coletivamente, inclusive para ler textos em outros idiomas. Por ora, seria suficiente que o leitor compreendesse seu próprio idioma. Caminhamos lentamente já que muitos não o dominam.
    Outro aspecto óbvio que também passou despercebido é que se escrevi um artigo para um site (www.novae.inf.br) em 2002 é porque considero a ferramenta com uma possibilidade de comunicação. Não é o caso de descer das nuvens, mas de não ficar pousada, ou aterrisada, sobre elas.
    Finalmente, quanto ao crédito. Não me intitulei nada, apenas o editor da Novae – onde o também editor do site Espaço Acadêmico (Antônio Ozaí) buscou meu artigo lá em 2002 – tinha por hábito inserir a profissão e a formação das pessoas que colaboravam com a revista. Como atuo nas áreas em que me formei, penso ser justo colocar o crédito.
    Comentários como estes, sem propósito, reafirmam o artigo, pois, uma ferramenta mal utilizada não resulta num trabalho eficaz e honesto. Ao contrário do debate sério, crítico que realça a importância do trabalho humano (que é a transformação: subjetiva e objetiva), feito à caneta, a lápis, datilografado, representado, fotografado. Enfim, que expressa a opinião humana em sua real complexidade.
    Saudações
    Gislene Bosnich

  7. Hummmmmm!

    Que silêncio… Será que foi alguma coisa que eu disse?

    Abraços ao Maurício.

    Nestes Termos,

    Mittaraquis

  8. A primeira parte (os três primeiros parágrafos) do rosário de opiniões de Gislene Bosnich é uma seqüência de obviedades. Em seguida, a autora observa que a internet não substitui a ida “real” a um museu. Isso é verdade. Mas a ida “virtual” a museus, via internet, tem dado a oportunidade a muitos (incluo-me) que não têm e, talvez jamais venham a ter possibilidade de visitar o Louvre ou o Museu do Prado ou a Tatty Gallery ou o MOMA. A internet está a serviço justamente dos que não dispões do tempo e do dinheiro necessários para a realização de uma viagem internacional. Quanto a afirmação de que não encontramos tudo na internet, esta é tão verdadeira quanto o afirmar que tudo pode ser encontrado na rede. Proporcionalmente, tem mais a ser encontrado do que o contrário. Livros raríssimos podem ser baixados, sim. É certo que há livros que não podem ser “baixados”. Mas a verdade é que não são necessariamente os raros. Os lançamentos literários são, hoje, em virtude de dezenas ou centenas de sites de download grátis, protegidos eletronicamente. Vez por outra há a quebra dos códigos e o povo consegue uma coisinha aqui, outra ali. Mas tem sido freqüente a quebra dos links estabelecidos pelos baixadores profissionais, terror primeiro das editoras. Afirmar, outrossim, que a internet não é uma imensa biblioteca é, no mínimo má vontade e, no máximo, prova de ignorância em um nível que só não digo beirar o inacreditável por já há muito me haver convencido de que ignorância não conhece limites. É simplesmente (?) desconhecer (lamentável) ou fingir não conhecer (desprezível) grandes bibliotecas virtuais, muitas frutos de trabalho sério; v.g. Perseus, ou o Arquivo Histórico Ultramarino. Neste último, por exemplo, foi onde localizei (e baixei, senhora “realidade”) uma obra completa do Padre Anchieta, que me foi muito útil em minha tese de mestrado, na qual trabalho com a milenar pedagogia da catequese, tendo antes, também pela internet, conseguido êxito em baixar documentos dos séculos XVI e XVIII, além de documentos pertencentes ao medievo, competentemente digitalizados (auxiliaram-me e muito durante o processo de pesquisa, após o qual realizei uma genealogia da pedagogia catequética, desde a queda do Império Romano do Ocidente até a Modernidade). Quanto aos termos capitalismo e pos-modernidade, não demorarei sobre eles por não ter idéia (se bem que até já faço uma) do seu conhecimento de causa em relação às referências históricas que “provocaram” a cunhagem de ambas as palavras. Quanto parecer contraditório a utilização da internet para falar mal dela, só pode parecer àqueles que ignoram por completo a História. Até por que a senhora “realidade” diz (pomposamente) ser necessário lutar no campo do inimigo para que se possa vencê-lo. Isso é um pastiche do discurso gramisciano ou, ainda pior, da práxis criminosa alardeada por Stalin e Lenin. O risível é a pretensão de se ter o poder de transformar o campo inimigo, deixando de reproduzir sua lógica (novamente me pego pensando o que a lustrada senhora entende por lógica, gênese e afins…). Risível por eu continuar tranqüilo, pois, se depender do discurso panfletário de péssima qualidade (ou tocante ingenuidade), as coisas, graças a Deus, continuarão como estão e melhorarão no ritmo mais ou menos esperado. A “ensaísta” percebe nos “sites noticiosos” o poder de “ausentarem-se da realidade do mundo”. Ah, façam-me o favor… Surpreso estou, sim (bem, nem tanto), com o fato da REA abrigar um amontoado de besteiras como esse produzido pela “pensadora”. E quando a mesma afirma “que deve existir uma intenção na comunicação, qualquer que seja e para o que seja”, me senti no mundo de Alice, pois o non-sense parece ter predominado a comprida filosofice. Já que, antes, as intenções são criticadas, se bem entendi. Quanto a estarmos fartos… Quem, cara-pálida? O parágrafo seguinte, o que inicia com a palavra “justiça” (clamei também por ela) e termina com a palavra “realidade” é emblemático no que concerne a se falar nada com coisa alguma: “escrever não tem sentido, se for atividade de ermitão”. Sei que é perder tempo, mas fico a me perguntar se a “jornalista independente (que vem a ser isso???) e socióloga (formada e pós-graduada onde e com que objeto de pesquisa???) leu algo da História do Pensamento Cristão, se pelo menos ouviu falar de Etienne Gilson ou Foucault, para saber do que está falando quando se vale do termo “ermitão”, qual a atividade que um ermitão exerce, e o que teria a ver “ermitão” com escrita no sentido que a “cientista” usa o termo, já que este se refere a uma condição sagrada, só plenamente compreendida por quem tem um conhecimento razoável da Tradição (ah, é verdade, a “intelectual” é independente, pode afirmar sem conhecimento de causa e se dar ao luxo de repetir clichês). A frase: “Ninguém escreve para si mesmo. (A não ser em momentos muito especiais)”, merece, na minha modestíssima e rasteira opinião, lugar na seção de frases das revistas semanais. Em nada fica a dever às proferidas por um tal excelso ser malacológico. E não para por aí. A logorreia ajunta, também, termos a esmo, tais como: “cotidiano real” e “mídia de massa” e “conceitos e interesse deslocados da nossa [minha, não] realidade”. Quanto a informação sobre o que lhe agrada ou não… Fico feliz por expandir meus conhecimentos com mais esse dado, tão essencial. Ah, e se o capitalismo vive uma “fase desumanizadora”, talvez a “egrégia” oradora possa informar a um pobre de espírito como eu, qual a fase humanizadora do mesmo dito regime. Graças aos Céus, chego quase ao final dessa purgatória análise: a estudiosa se vale de expressões como “Torre de babel”, para falar de individualismo (quando se sabe que o evento permitiu que culturas diversas surgissem) e “mitologia católica” (da qual a “pesquisadora” afirma, sem me consultar, já estarmos fartos). Sobre o último parágrafo… Reconheço: faltam-me forças. Meus sentidos já não respondem como deveriam e sofro agora de descoordenação motora e mental. Mas ainda reúno o pouco de alento para ler: “É preciso parar de apenas enviar o artigo por e-mail aos amigos”. E depois algo sobre abraçar e um tal de “cotidiano severo e possibilitador”. Ok, a senhora realidade venceu, batatas fritas (a banda Blitz, lembram?). É melho abrir um Bordeaux, separar uma porção de gorgonzola, ouvir Bach e olhar a chuva. Quem sabe assim, possa, aos poucos, aliviar o espírito, este atarantado por se ver diante de tanta proficiência.

  9. Respeito o esforço despendido, mas vê-se um texto carregado de ódio, rancor, com considerações literalmente quixotescas.

    Este moinho gigante não é um “inimigo”.

  10. Tenho defendido a tese, em algumas discussões políticas internéticas, que a internet, embora seja uma Revolução em si mesma, não fará, ela mesma, sozinha, algum tipo de Revolução que altere as mãos da propriedade dos meios e bens de produção, terras, sistemas financeiros e midiáicos, a não ser as Revoluções de costumes passageiros, mesmo compreendendo a permanência já atemporal da ampliação dos raios de ações individuais, mas também corporativos (este em maior volume).

    Outrossim, temos de perceber que a internet é ainda utilizada nos países pobres por baixa densidade populacional, visto que mundialmente 10% das pessoas, detêm 75% de tudo o que existe.

    Assim, sem desconsiderar em absoluto qualquer Revolução Tecnoólgica, e a internet é uma delas, não as vejos, em si mesmas, como algo “determinadamente revolucionária”, naquilo que, quase que perpetuamente entre nós, mantem as diferenças de classes e a exploração de muitos, por poucos.

    Recomendo a leitura do excelente artigo de nosso geógrafo maior Milton Santos (gente boa morre cedo…), cujo título é Inovação Tecnológica ou Abertura de Mercados?

    E mais um Hai-Cai do Poeta Popular, o Escaramuça

    A vontade de te tocar
    Não se sacia
    Na internet

  11. Gisele,
    Muito pertinente sua reflexão…
    Ela me remeteu a polêmica dos chamados cursos de Educação à Distância – EAD…
    Será que dá pra substituir um curso presencial por um que é ministrado em sua quase totalidade pela INTERNET?
    Ao meu ver, a rede, assim como a EAD são alternativas, mas nunca poderão ser encaradas como algo a substituir o contato humano direto!
    Abraços!

  12. a internet foi a forma mais rapida que o homem criou para propagar os seus próprios interesses já que peculiar ao mesmo.

  13. A internet reflete o que as pessoas são em sua materialidade, no cotidiano de suas relações sociais, reprodutoras de si mesmo. Para mim, o problema elencado por Gisele não é da internet, mas sim dos seres humanos em geral.
    Vivemos como dentro de ovos, revestidos de espelhos, tudo que olhamos só vemos a nós mesmos. Assim sendo, os blogs, orkuts, dentre outros meios de socialização são utilizados para exarcebar o eu, não o nós, como entendo que a Gisele propõe.
    Enquanto vivermos em um eucentrismo, no exacerbamento de um individualismo voltado para auto-promoção, no desejo de nos tornarmos mercadorias mais atraentes para o grande mercado de corpos e almas, nada mudará.
    Acredito, também, no trabalho coletivo, como fazemos agora. Devemos ser pontos de reflexão, um rede contra a hegemonia do eu, em detrimento do nós.

  14. Gisele!
    Extremamente pertinente, perspicaz e verdadeiro teus comentários.
    Em minha atividade profissional seja como consultora ambiental ou em sala de aula, sempre coloco que a ferramenta “internet” é valioso auxilio em nossa vida profissional, mas, não pode ser tomada como um fim unico.
    Há outras fontes de pesquisa e analise, sob nossa responsabilidade e busca.
    Abraços,
    MG

  15. Gisele, concordo plenamente com seu ponto de vista e mais, penso que transformaram a internet em algo tão “indispensável” que se tornou um fator de risco para nossa liberdade e a segurança de nossos filhos e netos, pelo acesso indiscriminado a sites sujos e perigosos que poluem a mente, colocando-os a mercê de pessoas inescrupulosas, todos os dias. Se não estivermos atentos a tudo isso, corre-se o risco de, como em muitas situações de fantásticas descobertas ao longo da história da humanidade, tais como: a pólvora para confecção de explosivos, o raio laser usado como mira de armas e fixadores de alvos para lançamentos de bombas aéreas, o avião para lançamento de bombas e ataques aéreos, a quebra do átomo que gerou a bomba atômica para destruição de Hiroshima e Nagasaki, o celular usado para ameças e sequestros, os propulsores a jato utilizados nas bombas V2 lançadas na 2ª guerra mundial sobre a Inglaterra pela Alemanha, entre outros milhares, de má utilização e que se trasformaram em verdadeiro pesadelo para a humanidade.
    Deus a ilumine sempre, Namastê.
    Dilene Marta Vieira – Bom Despacho – MG.

  16. Gislene Bosnich

    Por favor aterrise. Desça das nuvens.
    Você parece ser espanhola. “Onde hay gobierno, Yo soy contra”.

    A Internet todos os dias me dá o prazer de ver e falar online com meus amigos e parentes que estão do ooutro lado do oceano. Além de outras maravilhas que proporciona.

    Sai da ignorância, e se integre ao mundo moderno.

  17. parabéns a Gisele pelo excelente comentario e pela reflexao que da ao fenômeno internet as devidas proporçoes, chamando a atençao para seu valor como instrumento – como tal, exigindo um minimo de pericia para nao se voltar contra o manipulador.
    abraço,
    Regina

  18. Olá Gisele, suas indagações são bastante pertinentes, mas gostaria de começar uma discussão mais ampla sobre isso, que tal?

    Concordo contigo quando mencionas o fato de que muitos blogs praticamente reproduzem um comportamento que nada agrega ao nosso modo de vida real, em carne e osso, e existem apenas para delinear mais ainda as disparidades sociais e informacionais. Talvez você concorde comigo, por exemplo, que diversos blogs de design, tecnologia e publicidade são alimentados por pessoas de classe média/alta, cujo poder aquisitivo é totalmente díspar daquele da maior parte da sociedade brasileira que aos poucos começa a ter acesso à internet com computadores de baixo custo ou em lan houses.

    No entanto, eu pessoalmente acredito, e perpetuo, no sentimento de que podemos utilizar a Internet de forma a nos tornarmos mais próximos. Um bom exemplo disso aconteceu hoje mesmo, em que participei de um evento sobre as Mudanças Climáticas em Salvador que fez parte de uma rede de eventos mundiais, e tudo isso foi organizado online. Em outras palavras: essa rede específica causou o encontro de diversas pessoas em prol de uma realidade social/ambiental e levantou pontes entre pessoas distintas que outrora não poderíamos imaginar que nos encontraríamos e trocaríamos tantas ideias boas.

    Concordo quando falas dos propósitos e que o mundo virtual não substitui o real, mas penso que essa conexão possa ajudar a estabelecer redes de contato. O que falta, porém, para a maioria das pessoas (no Brasil) é critério. As pessoas não foram ensinadas a organizar prioridades e ter critério nas escolhas. A Internet só amplia a forma como as pessoas encaram e atuam no cotidiano.

    Discordo porém, quanda falas que um livro raro nunca será achado na Internet, e que ela deve ser(é) usada apenas como uma forma de encomendar tal livro, tal publicação. Eu espero o dia em que o conhecimento humano – que como você pontua é o que na verdade reflete a essência da Internet – possa ser de livre acesso para todos os habitantes. Pode parecer utópico, mas na primeira vez na história da humanidade temos em mãos a potencialidade de democratizar a informação, a fim de produzir debates e gerar conhecimento em qualquer canto do mundo.

    Nem todas as minhas indagações estão nesse comentário, pois espero discutirmos com mais ênfase esse tema neste espaço!

    Agradeço desde já, e parabéns à equipe do Espaço Acadêmico pelo blog! 🙂

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