Pêndulos e gerações

Pe. ALFREDO J. GONÇALVES*

Primeiro foram nossos pais. Atropelados pela geração ansiosa e irrequieta dos anos de 1950-60. Em nível geral vieram, entre outros, as bandas de rock britânicas The Beatles e The Rolling Stones. Aqui no Brasil, o campo da música não foi menos fértil: Bossa Nova e MPB, mais tarde Tropicália e os Novos Baianos, e por aí afora. Nas ruas de Paris, de Ciudad de México, de New York e tantas partes do globo, através do chamado movimento “maio de 1968”, a juventude varria velhas tradições, antigas referências, estranhos costumes e estruturas obsoletas. Lutava também, entretanto, contra a atmosfera tensa da guerra fria e consequente bipolaridade do poder entre os dois gigantes, USA e URSS. De igual modo, questionava e combatia a corrida armamentista, nuclear e espacial, bem como o sistema capitalista de produção, e seu consumo frenético. Na busca pela liberdade sem limites, os jovens trataram de abolir etiquetas, comportamentos e visões de mundo ultrapassadas. O slogan “é proibido proibir” converteu-se numa espécie de lema e bandeira, senda cantado por Caetano Veloso. Na América Central e no Cone Sul, a arte e a cação engajadas se levantaram com força e resistência contra as ditaduras militares.

Depois fomos nós. Atropelados pela chamada “geração dos botões”. Nascida e crescida na passagem do século XX para o XXI, no início do novo milênio, sacudiu novamente os valores e contravalores dos próprios pais. Filha da Internet e do celular, navega pelas redes virtuais como o peixe na água. Move-se não tanto pelos argumentos racionais do iluminismo, da filosofia e das ciências humanas, mas por instintos e desejos, sentimentos e paixões. Provavelmente cansada, aborrecida ou desiludida com a palavra de ordem repetida por seus genitores – “conscientização, organização e mobilização” ou “direitos humanos” – tende a afastar-se dos movimentos e lutas populares. Diante das questões sociais que afligem grande a população, exibem boa dose de indiferença, para não dizer puro e simples distanciamento. Em lugar disso, procuram manter-se ligados ao prazer imediato, às baladas, à música alucinada e aos relacionamentos provisórios, efêmeros. Espertos em jogos eletrônicos, essa juventude, de forma implícita ou explicita, viu-se facilmente recrutada pela extrema-direita em ascensão, no sentido de fabricar e divulgar ódio e fake news. Com isso, acabaram por bombardear não poucos de seus amigos, familiares e parentes.

Por fim, serão aqueles que hoje posam arrogantemente de senhores, poderosos e autoritários. Atropelados por uma geração que talvez sequer tenha nascido, ver-se-ão sacudidos por tempestades e abalos sísmicos inéditos e imprevisíveis. Se atualmente apenas conseguimos arranhar as ondas superficiais da política e da economia, semelhantes abalos haverão de mexer com as correntes subterrâneas ocultas, ou com as placas tectônicas do poder e da riqueza. Cabe ter presente que, de uma maneira ou de outra, toda geração será capaz de produzir seus revolucionários e seus tiranos, seus santos e seus bandidos, como diz, referindo-se ao nordeste, o escritor brasileiro Jorge Amado. O pêndulo da história, incapaz de permanecer quietamente parado num determinado ponto, oscila de um lado a outro do espectro político-ideológico. Tampouco as gerações, uma após outra, se mantêm quietas e imóveis. Ao contrário, carregam energia suficiente para os movimentos mais inesperados e substanciais.

E aqui, no decorrer de toda trajetória da humanidade, entram em cena os jovens. São justamente eles que, normalmente, viram a mesa de pernas para o ar. Não suportam a hipocrisia e o jogo duplo dos adultos, não suportam os discursos floridos, mas vácuos e vazios. Costumam trazer sangue novo aos corpos decrépitos, bem como oxigênio primaveril às sociedades que se aproximam do outono. Com tamanho vigor e energia, rompem com a inércia e o comodismo dos povos envelhecidos, desmascarando sem pudor o avesso dos “bons costumes”. Contra as ideias, partidos e interesses da extrema direita, que hoje ganham terreno por toda parte, mas que, normalmente, caminham para tempos inócuos e tediosos, a nova juventude se auto recrutará para renovar a velha árvore infrutífera. Com efeito, enquanto a ideologia de direita tende a lutar para o acúmulo de renda, pode e riqueza, deixando de lado a grande maioria da população, os jovens com sua natural sensibilidade e generosidade saberão dar a resposta justa a esse estado de coisas. Assimetria e exclusão social, quando escandalosas, ferem os olhos, os ouvidos e o coração da juventude.


* Pe. ALFREDO J. GONÇALVES, cs, assessor do SPM.

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